Cecilia Rodrigues dos Santos é arquiteta, com mestrado pela Universidade de Paris X-Nanterre/França, e doutorado pela FAU-USP. Pprofessora adjunta e pesquisadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, escreveu, em 2009, sobre a importância das oficinas da São Paulo Railway, no bairro da Vila Anastácio, região da Lapa.
“No mês de maio de 2007, elaborei um documento – composto, conforme orientação, por breve texto justificativo (este que se segue) e uma série de dados e fotografias – com o objetivo de solicitar ao Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da cidade de São Paulo – Conpresp, a proteção de um monumento de fundamental importância para história de São Paulo, da cidade e do Estado, e mesmo para a história do Brasil. Trata-se das Oficinas da Lapa, localizadas à Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, n. 1000 (entrada pela empresa Alston e pátio ferroviário da CPTM e MRS- Logística), bairro da Lapa, São Paulo, conjunto de construções e equipamentos ferroviários que começaram a ser instalados no ano de 1895, neste mesmo local, pela São Paulo Railway – SPR, sendo inaugurado já em plena produção no ano de 1906, constituindo a primeira indústria ferroviária do Brasil.
As oficinas da Lapa são parte integrante do projeto de expansão da primeira companhia de estradas de ferro de São Paulo, a São Paulo Railway, inaugurada no ano de 1867 para levar a produção de café do Oeste paulista para o porto de Santos. Todos os estudos e pesquisas que se debruçaram sobre a história da SPR (inclusive aqueles aos quais venho me dedicando desde o ano de 1981) reconhecem a importância especial dessa ferrovia não só para o desenvolvimento e riqueza do Estado, como para o crescimento da sua capital.
Ao atravessar a cidade de São Paulo de leste a oeste, os trilhos da SPR ajudaram a definir a malha viária, determinando a implantação das indústrias que começavam a se desenvolver na cidade, de bairros residenciais e de áreas de serviços correlatos.
Ainda está para ser aprofundado o importante papel desempenhado pela SPR e seus funcionários, não só no desenvolvimento do conhecimento e tecnologia ferroviários, como também nas importantes mudanças sócio-culturais operadas em São Paulo, principalmente a partir do final do século 19, com reflexos claros nos esportes, nos sistemas de ensino e saúde, e na urbanização.
O próprio leito dessa ferrovia e seu entorno imediato, em toda sua extensão de Santos a Jundiaí, assim como o patrimônio material de ordem arquitetônica e tecnológica a ele vinculado, é conjunto de valor cultural inestimável – histórico, artístico, paisagístico e ambiental – carecendo de reconhecimento e proteção nacionais, de preferência através de ações de superação da visão pontual predominante nos processos de tombamento direcionados ao patrimônio ferroviário cuja tendência tem sido concentrar a proteção em edifícios e estações, isolando-os do contexto que lhes dá sentido, ou mesmo isolando documentação e tecnologia dos seus suportes.
O objetivo primeiro da criação da SPR – colocar em conexão o centro produtor de café do Estado com seu porto exportador – definiu para São Paulo uma posição sempre intermediária entre as duas estações finais localizadas uma em Santos e outra em Jundiaí. Inaugurada em 1901, a nova “estação de passagem” que a SPR construiu na capital – a Estação da Luz – marcou com sua arquitetura monumental a importância da próspera capital industrial. Mas as operações subsidiárias ao transporte ferroviário, cada vez mais complexas e importantes, não encontravam mais na mesma região da Luz, relativamente próxima do centro da cidade que crescia e se desenvolvia, as condições necessárias à sua expansão.
Em 1895, cedendo à pressão para que ampliasse a capacidade de carga, a SPR iniciou a duplicação do sistema funicular de transporte na Serra do Mar e investiu em uma série de melhoramentos ao longo da linha. Na cidade de São Paulo, além da nova estação, foi projetado e construído no Pari, o Almoxarifado Geral da Companhia, com um pátio que permitia o pernoite e manobras de trens de carga, incluindo a conclusão de 12.392 metros quadrados de armazéns para mercadorias.
As oficinas destinadas à montagem e reparação de locomotivas, carros e vagões – incluindo fundição, ferraria, calderaria de loco-breques e serra-breques (utilizados no sistema funicular), usinagem, tornearia, solda, caldeiraria, serraria e carpintaria, reparação de veículos e pintura, além de depósitos e escritórios – foram construídas na Vila Anastácio, bairro da Lapa. Localizadas estrategicamente para que pudessem captar do rio Tietê a água necessária às operações, as Oficinas foram servidas por um importante desvio e significativo pátio de manobras com até três bitolas de linha diferentes. A área escolhida para implantação do conjunto daquela que se tornaria uma grande indústria ferroviária de apoio à companhia, era de aproximadamente 100.000 m², em parte aterrada com os 160.000 m³ de terra retirados da região da Luz quando os engenheiros da companhia decidiram pelo rebaixamento das plataformas da estação e das linhas em até 6 metros em relação ao nível das ruas". (fonte: Vitruvius)
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